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3 memórias de Ayrton Senna (parte II): da raiva… às desculpas

Embora todos tenhamos cultivado a imagem de um Ayrton Senna sereno, simpático, uma pessoa suave, o genial piloto brasileiro também tinha os seus momentos irascíveis, em que conseguia raiar o desagradável. Na sexta-feira dos treinos livres do G.P. da Alemanha de 1988 as coisas não lhe estavam a correr de feição e o McLaren/Honda não estava ao seu gosto, perdendo para o rival Alain Prost.

Naqueles tempos, jornalistas a entrar nas «boxes» das equipas era algo mais ou menos normal e, para reportar para «A Bola», costumava aproveitar a «boleia» dos jornalistas brasileiros para falar também com Senna, agradando à enorme legião de fãs que ele sempre teve em Portugal. Naquele dia, contudo, algo me atrasou e perdi o «comboio brasileiro», descendo mais tarde à «boxe» da McLaren onde encontrei Senna a falar com o seu engenheiro, ar de poucos amigos. Esperei que a conversa acabasse e, quando lhe perguntei «o que se passa Ayrton?», ele olhou através de mim e disse-me com uma rudeza que não lhe conhecia: «Porque só vem agora e não veio com os outros?! Agora não falo com você!» e quase me expulsou da «boxe»… «Está o caldo entornado», pensei, «este agora nunca mais me vai falar por causa disto».

Horas mais tarde, dia de treinos arrumado, estava no «paddock» em amena cavaqueira com o Domingos Piedade e outras pessoas, a caminho do carro para sair do circuito, quando sinto alguém bater-me nas costas. Virei-me e era Senna. «Você me desculpe aquilo de há pouco, eu estava meio chateado e você apareceu na altura errada. Me desculpe, agora está tudo bem, ok?». Nem sei se cheguei a balbuciar algo, era a última coisa que esperava de um piloto de F1 com os seus gigantescos egos…

O grande Ayrton Senna, a caminho do seu primeiro título, estava ali humildemente a pedir-me desculpa? Quantos dos outros trinta pilotos presentes em Hockenheim teriam tido semelhante atitude? Aí confirmei não só o respeito mútuo que já levava alguns anos, mas a grandeza humana de Senna que, tendo tido um ataque de irascibilidade (talvez até compreensível…), tivera a humildade de desviar o seu caminho para vir pedir desculpas pela sua atitude. E lá continuámos a nossa relação profissional como se nada se tivesse passado.


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Acerca do Autor

Enviado-especial do jornal «A Bola» a largas dezenas de Grandes Prémios, nunca deixou de reportar sobre o Mundial, tendo nos últimos anos alargado a sua experiência aos comentários televisivos.